As pastilhas, a fachada, o piso... tudo virou um belo cenário para mim fantasiado de Batman, no auge dos meus incompletos cinco anos de idade.
Ao meu lado, as minhas irmãs Sandra (à esquerda, ajoelhada) e Rosana (à direita, em pé).
O portãozinho mencionado neste texto, que me serviu de apoio à fantasia de tentar mostrar a capa como o Batman fazia. Ao fundo, a (finada) casa da (também finada) dona Chiquinha. Era uma linda casa, que foi ao chão para dar espaço a um quadrado e feioso prédio.
Os anos passam, e com frequência passava em frente à casa onde morei, sem parar para ver com mais detalhe a transformação daquele imóvel e dos outros na rua. Algumas casas naquela rua foram demolidas para dar lugar a outros sobrados geminados, prédios e outras edificações sem charme, outras foram reformadas e desastrosamente “atualizadas” como se tivessem sido submetidas involuntariamente a uma versão “construção civil” de Botox e cirurgias plásticas. Umas poucas resistiram com as fachadas tal qual as vi pela primeira vez. Os paralelepípedos da rua foram cobertos pelo asfalto, e muitas das árvores que moravam nas calçadas foram cortadas, incluindo a da casa amarela de número 280 – casa essa que também fora vítima das “plásticas”, tendo perdido a fachada de cor de pintinho, o portão creme, e as lajotas de cor de telha deram lugar a um revestimento cerâmico mais moderno e apático. Entre as casas que resistem, está a da dona Montserrat, trazendo um colorido e a uma vizinhança que se acinzentou.
Ontem à noite, usufruindo de alguns momentos sozinho, retornei à rua onde vivi até os meus sete anos de idade. Caminhar por lá foi como rever o passado, mas ao mesmo tempo ver que aqueles tempos de infância ficaram bem longe. Além da simpática casa da dona Montserrat, está o Teatro Lauro Gomes (que na minha infância era chamado “Anfiteatro Prefeito Lauro Gomes”, e nada mais era que um teatro cinza e largado no bairro), e alguns prédios cujos negócios se encerraram mas felizmente não se ousou pintar as fachadas pastilhadas ou revestidas com pedras. A casa onde morei, no número 280 da Rua Helena Jacquey, hoje é a sede de um salão de beleza; segundo a funcionária que trabalha lá, o porão continua lá e é “enorme e meio sinistro” por ser totalmente escuro; a cozinha que existia lá desapareceu, junto com a garagem onde o carro da família dormia, mas a muito da casa original parece ainda existir, como a edícula ao fundo, os três quartos (agora são salas de procedimentos estéticos alheios ao meu conhecimento) e a grade da janelona da sala, remetendo aos tempos em que havia um portãozinho, uma árvore, cores e paralelepípedos. Saí dessa breve conversa com saudade daquela casa, da minha infância, e de um tempo em que a vida era mais simples e as pessoas conversavam entre si. E a casa do “Seu” Araújo? Ela está em pé, mas muito diferente daquela que conheci – cinza, sem graça, anacrônica, mas felizmente o mural de azulejos felizmente continua lá, resistindo ao tempo e mostrando que a vida pode ser mais colorida.
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