Compartilhando o significado de ter um carro antigo... ou mais de um!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O que é que você foi fazer no mato?


Uma viagem a 1948.
Vésperas de Natal costumam ser bem previsíveis para a maioria esmagadora das pessoas. Uns vão trabalhar nas lojas que aproveitam até o último minuto desta festa do consumismo para poder lucrar um pouco mais e assim equilibrar as contas desfalcadas pelo 13º salário dos funcionários e também dos impostos de Janeiro. Outros estão nestas mesmas lojas, fazendo as compras de última hora para um parente ou amigo, enquanto que outros estão trabalhando no preparativos para a ceia de Natal.
Enquanto isso, eu fui aprontar uma boa aventura, algo que faz tempo que não fazia - ir até algum lugar meio longe (e não necessariamente bonito) atrás de carro antigo, peças e coisas antigas. Graças a uma dica bacana do amigo da lista do Opala, o Anderson Castro (autor da maioria das fotos vistas aqui), nos embrenhamos para lá de Itapecerica da Serra num sítio isolado por uma estradinha de terra. O Anderson acabara de comprar uma carroceria quase perfeita de uma Variant e viu todos esses carros bacana ali, em repouso num galpão, ao sabor de chuva leve e muita poeira. 

Chegar lá já foi uma aventura por si só - trânsito, voltas mil e alguns telefonemas e, duas horas e meia depois de ter saído de casa, lá estava eu no local, que parecia ter sido abandonado às pressas porcausa de uma guerra, sem ter nunca mais sido habitado novamente. Somos recebidos por um simpático e falastrão senhor, proprietário de quase tudo o que está lá. A poeira dominava, não havia água para lavar as mãos, mas em compensação fui brindado por um trio e tanto - uma pick-up Chevrolet Brasil (provavelmente 61 ou 62), uma raríssima perua Chevrolet Amazonas (mesmo ano) e uma Veraneio de Luxo (provavelmente 68 ou 69) paradas lado a lado, semi desmontadas mas com funilaria perfeita e prontas para receber pintura e montagem (já que todas as peças delas estavam lá). Pergunto de curiosidade se elas estavam à venda e ele me responde: "Filho, até minha ( ! ) tá a venda aqui." Sim, por R$15.000 o felizardo endinheirado poderia adquirir qualquer um daqueles carros e dar o trato que eles urgem receber. Mas o melhor ainda estava por vir...
Chevrolet Brasil em busca de um dono.
Chegar num lugar e dar de cara com um motor Lexus V8 com câmbio, e com um Ford Y-block não é coisa que acontece todo o dia.
Chevrolet Amazonas (só vi duas de perto até hoje, e nenhuma tão lisa quanto essa) e Chevrolet Veraneio (igualmente lisa).
Seguimos para o outro galpão... e lá sim a mágica acontece. Lá naquele galpão estavam 12 carros - ou o que restou deles - parados, como se estivessem paralisados esperando por um destino mais digno que o esquecimento. Eram eles, dois Fusca (um 67 com motor 1200, e um que parecia ser 79), um TL meio caído, a Variant I 73 do Anderson (que será receptora de outra Variant I, só que 70), uma perua Fiat Panorama (enferrujadinha, coitada...), e um Citroen XM 92 V6 precisando de vários reparos (conhecido como "caminho para a falência"). 
Uma parte do galpão. E todos eles lá, dormindo...

Fusca 67 precisando de carinho. E um bom despachante para fazer novos documentos.
E junto deles, ainda há um judiado Skoda Tudor (aparentemente) sedan 2 portas, ano 1950, um Ford 1929 2 portas aparentemente completo, um Gurgel BR800 com motor de Fusca, um monte de peças que outrora compunham um Aero Willys sabe-se lá que ano (certamente pós 64, considerando-se a traseira), um Plymouth Sedan de Luxe 1948 LIN-DI-MAIS-DA-CON-TA, e um par de Dodge 1800 - sendo um Polara GL 81 automático e com painel Veglia (raro) e um simpaticíssimo Dodge 1800 aparentemente 75, com apenas 60.000 Km originais e carente de um bom banho, manutenção básica e um dono. Ah, e um bom despachante também. E pneus novos. Além de um bom chaveiro para fazer chaves para ele.

Skoda Tudor 50 e Ford A 1929, esperando por uma oportunidade de resgate.
Carros emparelhados, num experimento involuntáro de coleta de poeira e resistência à ação implacável do tempo.
Plymouth Sedan de Luxe 1948, impávido colosso que espera só por uma chance de um novo lar...
Plymouth 48 e o Dodge 1800 marrom, com apenas 60.000 Km originais.
Ainda neste galpão haviam motores, câmbios, caçambas, rodas... uma infinidade de peças que nunca imaginei que fosse encontrar por lá. E quase tudo com bons preços, mas acesso difícil. Perguntei o preço do Plymouth 48 e realmente está convidativo considerando o carro e estado de conservação. Falei par ao dono dele que só poderia conversar algo se vendesse o Puma GTB, ao que ele se prontificou: "Calma. Se vc quer o carro, ele é seu, depois a gente acerta". Recusei a tentadora proposta, afinal aprendi a não contar com o ovo no fiofó da galinha e muito menos a depois ficar pensando onde enfiar um carro tão grande sem que se tenha vaga de garagem para isso. 

Já o Dodginho... ai este Dodge 1800... servindo de casa para pó e insetos como se estivesse preso a uma cápsula do tempo, com essa padronagem de tecido tipicamente setentista (em tons de preto, marrom e laranja, como era na época), o interior sujo mas inteiro, quase tudo inteiro (só o banco do motorista está rasgado no assento) com itens que não se veem hoje como volante original, rádio Chrysler original, pintura ORIGINAL, NENHUM AMASSADO no carro... tentador. Eis que o simpático tiozinho me oferece "leva os dois Dodge por $X e eu te dou aquele motor de DKW que vc gostou". Foi difícil segurar a oferta, mas recusei ajudado por ter que levar dois carros de uma só vez, sem ter espaço na conta bancária e na garagem para eles.

Abre-se a porta para uma viagem (bem empoeirada e suja) para os anos 70.
Lateral traseira sem nenhum amassado, nem podre. Nem a Chrysler conseguia fazer isso em 1975.
 
Interior do Dodge 1800, modelo básico. Carpete de borracha original, painel sem nenhuma trinca e com rádio original, e volante praticamente perfeito.
Andamos por outros dois galpões com várias peças de caminhões e tratores novos e antigos, muita bugiganga, muita boa conversa trocada e para não dizer que saí de lá de mãos vazias, comprei um ventilador GE do final dos anos 60, que após uma boa limpeza será o mais novo enfeite da sala de casa.  Empurramos a Variant para o guincho e cada um de nós seguiu seu destino. E tanto o Dodge 1800 marrom quanto o Plymouth 48 não saíram dos meus pensamentos... o Plymouth tem um estilo fantástico, está inteiríssimo... mas tem o preço e o espaço que ele requer (ele é do tamanho de uma Blazer, se não for maior). O Dodginho marrom... bom, muita coisa tem que acontecer ainda - pelo menos vender o Puma GTB e dar um encaminhamento na Olívia, cuja obra é grande - então é algo para cogitar para o futuro. 

No fim das contas, foi muito divertido fazer tudo isso, sem GPS nem ideia de onde ir muito menos do que encontrar, e sair de lá sujo, cansado mas muito feliz e com a certeza que preciso fazer isso mais vezes e que ainda há muito o que ser explorado (e do quantas surpresas a vida pode te proporcionar, se você estiver disposto). Tal qual fazia há uns 12, 13 anos, sem ter um tostão furado na carteira, mas com muita disposição para compensar. Para mim, um presentão de Natal que ganhei.
  
Variant I saindo do repouso, a caminho de um longo mas promissor tratamento.

domingo, 18 de novembro de 2012

Tratamento intensivo de Olívia - parte I

Olívia e a caixa preta com os motores.
Olívia está num intensivão de reciclagem física, o que significa que no momento ela está num elevador automotivo, desprovida de suspensão dianteira, motor, câmbio, radiador e subchassi.
 
Nada disso é em vão. O motor dela já chegou, junto com o do Don (dois motores Chevrolet 350 Gen IV, marinizados pela Mercruiser, e com injeção eletrônica), as peças de suspensão foram para limpeza e banho de zinco (para posteriormente serem pintadas de preto), o câmbio de Blazer V6 está nos preparativos para ser acoplado ao motor novo, e as rodas, ah as rodas... serão substituídas por outras recém adquiridas, originais de Veraneio de Luxo - com o mesmo desenho, mas aro 15 e largura maior, o que a vai deixar com uma relação de transmissão final melhor e provavelmente mais macia de rodar (os pneus diagonais aro 16 que estão nela estão mais ressecados que a pele de cortador de cana). Esta semana encontrei a caixa de direção hidráulica, e com isso lá se vai aquela economia que estava fazendo para outras coisas... mas pelo menos vai sair aquela sensação de "navio em manobra" ao dirigí-la com o atual sistema de direção mecânica repleto de folgas dos pivôs e terminais de suspensão.

Motor e câmbio originais. Ótimo tamanho para um Opala ou Chevette, mas para uma pick-up grande...
 
O par de motores - o de baixo é o da Olívia.
O motor original, junto com o câmbio, foram removidos e guardados num cantinho protegido e escuro, para uso futuro em aplicação atualmente desconhecida (traduzindo: vou ver o que fazer depois), mas espero que fiquem pouco tempo onde estão, já que "motor parado é motor quebrado" então melhor mesmo é passar para outro. O câmbio vai ficar comigo, pois é bacana e raro demais para deixá-lo ir embora.

Espaço com folga para o V8 350 e todos os acessórios.
E já que a Olívia está toda acessível, resolvi dar uma olhada por baixo dela - e ela realmente está melhor do que o esperado. O chassi não tem soldas nem trincas, as poucas (mas perigosas) gambiarras estavam só na suspensão dianteira, e até mesmo a madeira da caçamba está conservada (na parte de baixo). Isso é muito bom, sinal que ela foi pouco abusada ao longo de sua vida.

Um chassi íntegro. Acredite em mim, mesmo com as fotos escuras (acima e abaixo).

Bom, agora que a coisa está andando rápido, o fator limitante é o financeiro e isso significa que é provável que ela só volte às ruas no início de 2013, salvo se conseguir vender o Puma GTB e mais algumas peças que não pretendo usar. Isso porque, depois de toda a grana que vai demandar a revisão da suspensão e freios, além da instalação do motor, câmbio e relação de diferencial, ainda tem que fazer o escapamento completo, reformar as rodas, comprar pneus, modificar velocímetro, comprar algumas peças de acabamento, fazer funilaria, documentos e elétrica. Todas coisas que doem no bolso e não se resolvem de um dia para outro. Mas enquanto as coisas não acontecem - nem do lado das "contas a pagar", nem das "vendas realizadas" - vamos curtindo o processo sendo realizado.

domingo, 11 de novembro de 2012

Olívia - a C10 mais lenta do mundo

A vontade de ter uma pick-up sempre existiu. Uma que fosse confortável, com estilo e grande o suficiente para carregar motores, portas, paralamas, e também móveis e vigas de madeira. O Sr Manuel, meu finado pai, era fã das pick-ups Chevrolet - teve uma Veraneio dourada (a qual ele adorava) e anos depois teve duas C-20 cabine dupla - a "pretinha", depois trocada pela "vermelhinha" - e quando eu tinha uma pick-up Corsa ele a usava com frequência para "carregar uns ferros e umas madeiras", devolvendo-a lavada, com tanque cheio, e um rosário completo de coisas que deveria ter feito nela e não fazia.  Por outro lado, nunca quis saber de pick-ups lentas, então Diesel sempre esteve fora de cogitação (principalmente pelo preço exorbitante), e a ideia de uma pick-up hot rod ou mesmo rat rod povoa meus pensamentos desde minha adolescência, junto com os sonhos de um Dodge Dart ou um Opala 6 cilindros.


Olívia, uma C10 de personalidade e sorte.
Pois nessas voltas que a vida dá, recentemente apareceu a oportunidade de começar a tornar tal sonho realidade, pelo e-mail de um amigo de Santana do Livramento (o Alberto Muller, da POAPARTS), anunciando uma Chevrolet C10 77/78 bege, que precisava de um trato mas tinha um preço convidativo. Após acertar preço, transporte para cá, e a vendas de peças para pagamento de parte dela, fechamos negócio. O detalhe é que ela não é uma C10 comum - ela é uma das poucas que saíram com motor 4 cilindros de fábrica, igual ao do Opala, o que foi feito pela Chevrolet na época para concorrer com a Ford e sua F-100 4 cilindros, cujo motor 2.3l foi herdado do Maverick 4. O sucesso da C10 4 cilindros foi, digamos, questionável. O motor era fraco demais para arrastar a pick-up com carga, e para se ter algum desempenho (mesmo que fraco), era preciso acelerar muito o motor e consequentemente o consumo era quase igual ao das C10 6 cilindros. A grande maioria delas acabou sendo convertida para Diesel e passando a vida útil sendo usada e abusada na carga de peso em cidades e principalmente na zona rural.


Tanto espaço no cofre para um motor tão pequeno...
Para sorte da Olívia, ela trabalhou mas não até morrer, e acabou sendo trocada por uma outra pick-up pelos antigos proprietários e ficando guardada até que o besta aqui se habilitasse a ver as fotos dela e depois comprá-la. Depois de alguns dias ela desembarca aqui na cidade e poucas surpresas surgem. "Poucas?" Você pergunta. Sim, foram poucas pois eu já esperava pelo pior e a experiência já me ensinara que, ao ver as fotos de algum carro na internet, divida a expectativa por dois ou três e terá a realidade. E no fim, até que a surpresa foi positiva, já que ela não está com podres, o estofamento está muito bom e o desgaste dela é natural para um carro que foi usado com parcimônia por quase 35 anos a fio. Em compensação, nunca dirigi um carro tão lento na minha vida - é verdade, o Irineu (Gordini) é muito mais ágil que esta pick-up e o motor, já baleado de uso, mal suporta o próprio peso. E a direção dela - mecânica, sem assistência hidráulica - não é pesada mas demanda tantas voltas ao volante que mais parece um navio do que um carro. Além disso, a suspensão dela possui "oportunidades de melhoria" - um jeito bacana de dizer que vai precisar de uma revisão completa e irrestrita, que vai envolver a troca de quase tudo. Freios? Que freios?


Na minha primeira volta com ela, a primeira coisa que aconteceu foi acabar a gasolina. Sim, nem cheguei a dar uma volta completa que ela pipocou e empacou no lugar. Por sorte, minha irmã estava passando e me resgatou para o posto de gasolina, onde enchi um galão de 5 litros e, com gasolina no tanque, Olívia voltou à vida, e mostrou que o que ela tem de valentia, tem de vagarosa... Alguns dias depois, lá foi ela para a oficina do Henrique para "aquela" revisão e alguns fretes neste interim. O traslado foi feito com quatro pessoas dentro, como a foto ao lado comprova as "quatro cabecinhas" lá dentro dela e pela velocidade parecia quase que um cortejo, já que a segui em outro carro e o máximo que chegamos foi 60 Km/h. Mas ainda assim, não é que ela virou a sensação de lá? A sensação só não foi maior porque chegando na oficina, a gasolina acabou de novo, e lá fomos nós de novo encher um galão no posto para abastecê-la. Muito curioso isso - andar ela não anda NADA (duvido que ela tenha passado dos 70 Km/h), mas consome como se tivesse sempre a mais de 200 Km/h. Entendeu por que o motor 4 cilindros não deu certo? 

O charme do interior rústico e funcional da C10.
Mas legal mesmo foi, quando ela foi realmente necessária para um carreto para o meu irmão, mesmo depois de um "tapa" no motor, ela decidir enguiçar na Vila Prudente, numa avenida bem movimentada num sábado de manhã. Além da grande frustração em não cumprir com o dever de ajudar ao meu irmão em algo que ele estava precisando, ficou o mico de esperar pelo Henirque (quem mais, afinal)? chegar para constatar um problema no platinado que meia hora antes havíamos mexido e não funcionado. Foi a única vez que fiquei chateado (ou melhor, puto) com a Olívia, mas isso já passou. E também teve a vez que ela começou a descer sozinha enquanto eu a carregava com peças (culpa de um freio de mão mais psicológico que físico)... enfim, com pouco tempo ela já tem um monte de histórias. Como ainda tem muita coisa a ser feita, vai reunir ainda um montão de outras histórias (espero que de viagens gostosas e momentos de alegria). E que seja bem vinda à família, que mesmo problemática, se diverte muito. O Sr Manuel adoraria vê-la e deixá-la como nova (certamente com um motor mais possante, mas daí é para outro dia), mas deixa comigo que - de um jeito diferente - a Olívia vai voltar à glória.


domingo, 4 de novembro de 2012

Manuela e a Teoria da Relatividade

Graças a Albert Einstein e sua equipe, teorias foram estudadas e colocadas em prática, para que a humanidade tivesse tantas conquistas como a viagem ao espaço, a geração de energia a partir do átomo e também, infelizmente, a criação da bomba atômica. Não precisa navegar muito na internet para ler sobre este brilhante físico, nascido na Alemanha em uma família judaica, e que adotou ao longo de sua vida as cidadanias - além da alemã - suíça, austríaca e norte americana. E por que desta homenagem a este homem e sua equipe, num blog sobre carros e histórias menos complexas? É justamente por termos colocado em prática a Teoria da Relatividade junto com a Manuela. 


Fazia um lindo dia de Sol em São Paulo no dia 28 de Outubro de 2012. Havíamos combinado com bastante antecedencia visitar um casal de amigos nossos - o "Chuva" e a Danila - para vê-los e a seus filhos, pois já devíamos há muito tempo uma visita. Esta família mora em Vargem Grande Paulista, que fica a 70 km daqui de São Bernardo do Campo e, normalmente, ir até lá leva por volta de uma hora e meia, já que a Rodovia Raposo Tavares sempre tem trânsito e é bastante sinuosa, e ir pelo Rodoanel é bem mais longe e demora mais. Iríamos em 3 casais - eu, a proprietária da Lucano Mosaico e escritora do blog homônimo (que também atende pelo nome de Adriana), e mais dois casais. Nada demais até aí, certo?

"Apenas" 67 Km separam São Bernardo do Campo de Vargem Grande Paulista, de acordo com o Google Maps.

O refinado interior da Manuela após serviço de tapeçaria.
Pois bem, a coisa começou a mudar de figura semanas antes, quando lemos este post no excelente blog AutoEntusiastas: Kombi - uma festa ambulante. O espaço que uma Kombi oferece é sem igual e, como todos nós iríamos para o mesmo lugar, qual o motivo de usar dois carros e estragar o papo? Um porém pairava entre nós: a Manuela não tinha cintos de segurança nem o interior prontos para a viagem. A ideia era boa demais para ser desperdiçada - seis pessoas viajando juntas, numa viagem curta e com todo o "cool factor" que a Manuela tem era algo irresistível, e que certamente ficaria na memória de todos. Então tomei coragem, raspei o cofrinho até que ele ficasse completamente vazio e mandei fazer o estofamento da Kombi guerreira, para que pudesse nos proporcionar uma viagem agradável e mais confortável do que sem forrações, rádio e cintos de segurança.

A nova e requintada cabine de Manuela.
Tudo bem, tudo pronto e todos empolgados para viajar... exceto a Manuela. Quando a Adriana foi colocar umas coisas na Kombi, veio uma surpresa desagradável - ela não tinha cintos de segurança traseiros pois o tapeceiro esqueceu de instalá-los. Liga daqui, pergunta dali, e chegamos ao consenso em seguir viagem assim mesmo, já que tudo estava pronto, e isso fazia parte da diversão. Seguimos então o início do passeio, saindo de SBC para o bairro de Moema em SP para pegar o primeiro casal, e depois para o Itaim pegar o segundo casal e assim, pararmos somente em Vargem Grande Paulista. Fomos devagar, entre 80 e 90 Km/h para não assustar a ninguém e manter a Manuela tranquilinha para o primeiro passeio longo desde que ela se juntou à família. Só que esquecemos de uma coisa... o calor. Ah, o calor da primavera que fez São Paulo parecer uma versão seca de Manaus tamanho o calor que fazia, e que provocava suor em qualquer pessoa que se aventurasse ficar mais de cinco minutos fora de um ambiente com ar condicionado... e lógico que Manu não tem ar condicionado (essa "tecnologia" ainda não chegou para ela). Porcausa do calor de 35ºC em média, a grande diminuição do nível de ruído interno dela e as melhorias no estofamento passaram despercebidas e a constatação que a suspensão da Kombi foi dimensionada para cargas - logo, a maciez passa bem longe - ficava beeeem nitida.

Manuela valorizando a fachada do prédio.
Chegamos ao Itaim e buscamos o casal derradeiro para a viagem, e já estávamos suficientemente suados e beirando a irritação porcausa do calor, ruído e pulos da suspensão, mas mesmo assim pegamos a estrada. Um detalhe importante: aqueles vidros basculantes laterais (os quais paguei uma grana para comprá-los colocá-los na Manuela durante a funilaria e pintura) NÃO ABRIAM. Pois é, então a ventilação interna estava restrita aos vidros das portas e a um ventinho que era captado acima do parabrisas... os três pobres passageiros do banco traseiro foram sendo cozidos lentamente ao sabor da Raposo Tavares, que para ajudar estava com um trânsito maior do que o normal para o dia e horário. O Sol banhava o teto da Kombi, os cintos de segurança dianteiros frouxos (defeito de tapeçaria, a ser resolvido) junto com a ausência de uma "frente" geravam pânico nas duas passageiras da frente quando nos aproximávamos de algum carro durante o trânsito, e para ajudar, cada calombo na estrada era sentido pelas nossas bundas e pela suspensão que passara a fazer uma batida metálica. Muitos viam a nós e Manuela nas ruas e estradas e faziam sinais positivos, ao qual retribuíamos com uma pontinha de inveja por estarem em carros mais macios, e por vezes com ar condicionado. Nunca meros 67 Km passaram tão lentamente na vida dos seis ocupantes da Manuela... havia assunto para falar, mas não havia paciência proporcional, e a vontade de ar fresco (mesmo que de um ventiladorzinho) dominava a todos. Uma hora e meia depois, chegávamos ao Chuva, que riu até cair no chão ao nos ver chegando de Kombi na casa dele, e mais ainda ao ver todos suados, vermelhos mas sorridentes pelo fim da primeira etapa da jornada.

Mas, depois escureceu e era chegada a hora de irmos embora de lá.  Antes de sair de lá, a Manuela desceu de esgueio e a roda de tração não encostou direito no asfalto. Para dar tração, o Carlos (na foto, agachado) e o Walter (na foto, com a camisa da cor da Manuela) saíram, subiram no parachoque traseiro para que ela tivesse tração e saísse do lugar... (era a cereja que faltava no bolo). O tempo fresco da noite ajudou E MUITO o retorno, mas todos estávam bastante cansados para longas conversas após um dia... inesquecível. Nem pareceram as cinco horas psicológicas (que foram de fato apenas 90 minutos) que levaram de São Bernardo do Campo até Vargem Grande Paulista. O importante é que todos chegamos bem, a Manu se comportou muito bem dadas as limitações de projeto dela (afinal não enguiçou ou engasgou em momento algum) e que no dia seguinte, todos demos boas risadas de tudo isso.




Todos juntos para a foto. Só faltou a cachorrinha deles, a Bozolina.
Mesmo com estes contratempos, faria tudo isso de novo. Aliás, repetiria esta viagem ou mais longas agora, apenas com algumas providências (que serão tomadas agora em Novembro):
  1. O tapeceiro vai colocar os cintos de segurança nos bancos traseiros e adequar os dos bancos dianteiros. Não dá para ficar sem cintos atrás e com os cintos dianteiros alargando à toa. 
  2. A Manuela vai para o vidraceiro para dar um jeito de abrir e fechar as janelas basculantes do salão. Ficar com quatro janelas travadas no calor sendo passageiro do banco de trás é o tipo de experiência inesquecível num dia quente. 
  3. Além de uma caixa de ferramentas para eventuais emergências, ela vai ganhar uma caixa de isopor para colocar gelo e bebidas para as próximas viagens.
Só de lembrar do segurança do flat onde o casal Andrea e Carlos moram, ao nos ver chegando de Manuela às 21:30 do sábado, fazendo uma cara esquisita e ensaiando falar "que não era hora de entregas" até ver que o belo casal saía do carro... valeu cada gota de suor desprendida de nossas peles. Mas por enquanto, a previsão é que viagens mais longas só quando chegar o outono e junto com ele, as temperaturas mais amenas e também a conclusão de do que precisa ser feito na Kombi.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Puma GTB - um carro de comportamento selvagem

O Puma GTB é o tipo de carro que te faz esquecer o que é ter prudência. Há muito tempo não o dirigia e, agora que ele "voltou ao normal" com o câmbio e mecânica originais no lugar, eu reparei que havia me esquecido completamente como era a sensação de andar neste carro - e sim, ele é selvagem. 

Cara de mau. Mas um "mau com classe".
Fui buscá-lo e após me ajustar nos bancos relembro como ele é baixo. Bem baixo, a ponto de não fazer sentido a expresão "descer do carro", para substituí-la por "subir do carro". Viro a chave, e o motor de Opala 6 cilindros 250-S ronca sem dó nem paciência. Os instrumentos que estão no painel (ah, se arrependimento matasse...) iluminam bem - tão bem a ponto de parecer que dirijo uma espaçonave. Engato a primeira, com engates duros mas precisos e saio, com o carro chacoalhando do motor frio, e chego na avenida.

Bonito sem ser fresco.
 Acelero para pegar a avenida e junto com ela vem cantada de pneus, saída de traseira e um ronco de motor como quem diz "hoje eu estou irritado". Endireita daqui, tira o pé dali e seguimos em frente. Um barulho no lado direito dá a entender que tem algo raspando, pode ser freio que esqueceu como é funcionar depois de tanto tempo parado. Ligo o som, e sou saudado com uma incômoda interferência, que depois se transforma num ensurdecedor mau contato, que me faz desligar o rádio correndo. Ah, maldita hora que eu cismei de mexer neste carro! Chego no prédio. "Ah, saco. O portão de trás não funciona a esta hora.", lembro ao pegar o aparelho. Mas daí, puf! O carro morre... e o motor de arranque não vira. Tento uma, duas, três vezes... e o motor de arranque vira, só que o motor não dá partida.
 
O motor nervoso que move o veículo.
 "Ô merda, não me vai pifar a uma hora dessas!", penso eu cansado, irritado com os probleminhas do carro e louco para ir ao banheiro. Tento mais algumas vezes e vou à pé para a garagem pegar um litro de gasolina que deixo para eventualidades como essas (quem tem carro antigo sabe como é), pensando "Corno do Henrique, custava colocar mais gasolina??". Cologo combustível no tanque, um pouco no carburador e ele liga! Mas logo em seguida morre. Faço isso mais umas duas vezes e nada dele funcionar, provavelmente por estar inclinado na rampa. Desço do carro com muita raiva, xingo a ele, ao mecânico e a mim mesmo, e aparce o porteiro do prédio, que gentilmente abriu o portão fora de horário só para eu entrar com o carro e colocá-lo na garagem. No plano, foi virar a chave e, pronto, ele funcionou. Guardei-o na vaga (lógico que ele morreu ANTES de chegar na vaga), e fui para casa finalmente "desaguar" e dormir - fedido de gasolina, cansado e planejando vendê-lo por qualquer coisa, até por um passe de ônibus.
  
Personalidade em todos os ângulos.
Dia seguinte, cabeça mais fria e planos mais concretos. Separo o rádio para instalar no lugar da parafernália sonora e ruidosa que está nele, e vejo o telefone de quem troque os instrumentos "árvore de natal" pelos originais (os quais continuam guardados). E enquanto lembro que preciso falar com o vidraceiro para ajustar o vidro da porta do motorista, pego ele para dar uma volta e tirar umas fotos e assim, facilitar a busca de um novo proprietário para ele. A porcaria do cinto de segurança não sai do lugar, então vou assim mesmo. Liga, anda, morre, liga de novo, anda de novo e sai do prédio. Dobra a esquina e sobre a rua num ímpeto que me fez lembrar porque eu acabei comprando ele. Paro o Puma para as fotos e as pessoas que passam a pé, nos seus carros ou mesmo os aprendizes de motoristas que por lá fazem suas aulas torcem os pescoços para vê-lo e admirá-lo. Tiro com as mãos a poeira dos bancos, tiro algumas fotos e saio dali em direção ao posto de gasolina para colocar "direito" gasolina nele.

E que neblina!
E quanto mais ele acelera, para, vira e segue reto, melhor fica a relação entre nós, ainda que entumescida de desconfiança de ambos os lados. Com o Puma abastecido e com água no radiador, voltamos para casa e lá fica ele, na garagem, cada qual com uma sensação de que há ainda tanto o que fazer, mas muito o que aproveitar. Que saudade de toda essa selvageria e elegância que faz com que qualquer "Camaro amarelo" pareça carro de menino. Que vontade de consertar tudo e ficar com ele para sempre, e tentar mostrar para o mundo que dá para ser diferente - basta querer. Mas daí vem a consciência e lembra de várias coisas - dos outros carros que também precisam de atenção, de tudo que precisa ser feito no Puma para ficar "ao meu gosto" HOJE, e que além de selvagem, ele é um carro ciumento, exigindo toda a atenção e cuidado para ele. Então, melhor esperar mesmo que venha alguém que se encante por este Puma como eu, e que pague o valor que ele merece e assim, se dedique a ele como lhe é merecido. Mas da mesma forma que uma viagem de férias inesquecível, vou me lembrar deste carro com um sorriso no rosto.


E eu nem me lembrava como era sentar em bancos Recaro...

domingo, 9 de setembro de 2012

Detalhes

Wenceslau recebeu ontem a esperada vistoria para obtenção da placa preta, e felizmente foi aprovado com pequenas ressalvas. Logo de cara, o avaliador do clube soltou: "O carro está bonito... mas ainda faltam algumas coisinhas, não é?" A verdade dói, mas era um fato que não dá para esconder, e assim como quem constroi uma casa para morar, quem restaura um carro antigo vê coisas depois do serviço pronto que ficam incomodando até que elas sejam resovidas, mas que a grande maioria das pessoas não repara. Saí da vistoria com o certificado em mãos (YESSSS!!!!), e ao chegar em casa comecei a procura na internet pelos detalhes indicados e mais algumas outras coisas que não foram indicadas mas me incomodam muito. Mesmo encontrando a maioria do que precisava, preferi esperar e dar um pulo no encontro no Paço Municipal de Santo André para procurar pelas peças, comparar preços e comprar o que for necessário - o surpreendente é que no encontro TUDO estava mais barato que na internet... então, fica a dica para os que forem comprar peças, principalmente no Mercado Livre. Salvo peças mais difícieis como os farois originais Cibié, vale muito pesquisar antes. 

E o que foi feito desde ontem... e precisa ser feito ainda, segue abaixo:


 Nas colunas há dois furos que são tampados com tampinhas plásticas. Em cima foi tudo certo para colocá-las hoje, porém embaixo os furos não foram feitos corretamente durante a funilaria e as tampas não encaixaram de jeito nenhum. Mais um servicinho para que o funileiro refaça, daqui há alguns meses, dentro dos "ajustes necessários após funilaria". Tem também um grampo da forração de porta desencaixado, que amanhã será resolvido.


As manivelas dos vidros foram substituídas pelos modelos originais do Fusca 70 - 74. Só não contava que a manivela do lado do motorista fosse soltar o botão DURANTE a instalação. É, quarta-feira que vem eu a troco com o vendedor, que estará no Poliesportivo de São Bernardo do Campo.


Este é um defeito que me deixou encafifado - a guarnição do vidro da porta do lado do motorista está aderente demais ao vidro e, ao descê-lo, a borracha enrosca e puxa toda a guarnição para baixo (detalhe: a foto não virou no sentido anti-horário, então incline sua cabeça para a direita e você entenderá melhor a situação - acho...) . Vou ter que levá-lo na vidraçaria que colocou esta borracha para substituí-la.

 Os canos de escapamento serão substituídos por um par original. Além de levemente enferrujados antes da funilaria, durante a pintura a tinta grudou na ferrugem e ninguém lembrou de limpá-la. 



A tampa do esguicho está quebrada, então quando se coloca pressão, ela vaza por completo. Haja e lá vai Araldite!





Na área de Iluminação, um farol quebrou e, como já não era original, os dois serão substituídos por um para fabricado pela Cibié nos anos 70 - já achei um farol, só falta o outro. A chave de seta será trocada por uma do modelo original, que já foi encontrada, mas preciso comprar, o mesmo valendo para o miolo do volante, que mesmo original está todo trincado e não para mais no lugar. E detalhe: tem também as guarnições dos farois para evitar que eles atritem contra o paralamas e removam a tinta, causando corrosão no futuro. 

Fora isso tudo descrito acima, ainda tenho que:
  • lubrificar os trilhos dos bancos, e assim tirar o incômodo "nhec nhec" que acompanha o Wenceslau desde que saiu da funilaria;
  • pintar o assoalho por dentro (vejam o post anterior - o que ocorreu foi um vazamento de fluido de freio, que tirou toda a tinta do assoalho!);
  • colocar a chave geral na bateria, para assim preservar a coitada por bastante tempo;
  • pintar o cano de freio que passa por dentro do carro;
  • ligar e trocar o alto falante traseiro (aliás, quem tiver um alto falante 6x9 em bom estado para doação ou venda, agradeço imensamente!)

Nada disso impede que eu vá ao despachante já para dar entrada no pedido para emissão da placa preta, o que será feito o quanto antes.


Enfim, o moral da história: mesmo um carrinho simples como um Fusca tem tantos detalhes que exigem da paciência de quem quer restaurar um carro. E, se bobear com as contas e profissionais, a conta sai muito mais cara que o inicialmente previsto, o que não foi o caso dele (mas vale a dica). E tem mais um "moral da história" - carro antigo nunca fica pronto, por mais que se ache isso. Só fica pronto se ele ficar guardado, sem uso nem diversão... mas daí, qual a graça disso tudo? Então amigo/amiga que pensa em embarcar numa dessas, vai o conselho: planeje-sem tenha coragem para não desanimar com os pequenos contratempos (que aparecem sempre, mas dá-se conta de todos eles) e divirta-se resgatando história e tornando a vida e as ruas mais coloridas.