Curiosamente, esta semana tive diversas lembranças de episódios passados com este Dodge 75, e outros tantos a respeito do Dodge, pois tive que me enfiar em algumas bibocas para achar peças, ficar com o saldo bancário no vermelho para pagar alguns serviços (muitas vezes mal feitos) e também arrumar discussões acaloradas para defender o tão-querido carro antigo em questão.
O primeiro deles foi ao tirar o carro da oficina "Lábios de Suíno" que fez o serviço de mexânica, funilaria e pintura (acho que com técnicas experimentais realizadas por aprendizes sem fluencia no nosso idioma); meses depois de entrar na oficina e provocando a minha primeira quase-insolvência, eu finalmente iria dirigí-lo para todos os lugares, o mais longe que pudesse, num prazer inenarrável e inebriado pela combinação de expectativas e saudades. Ajusta daqui, acerta dali, dá-se a partida e... nhec nhec nhec nhec nhec... puff. Nhec nhec nhec nhec nhec... puff. Cacete. Nhec nhec nhec nhec nhec nhec nhec nhec nheec nheec nhok nhok nhok nhook..... puff. Nhok nhook nhuk nhuk.. puff. CACETE! Lá se vai a bateria!! Até que o juvenil aqui (e o "chefe de oficina" da super "Pork Lips Mechanical Works Ltd" se ligasse que era necessário jogar um pouco de gasolina no carburador para ligá-lo depois de algum tempo parado (algo como dois ou três dias). Faz se uma ligação em paralelo com outra bateria (a famosa "chupeta") e, depois de termos a brilhante ideia de jogar gasolina no carburador, dou algumas bombadas no acelerador, e... nhec nhec nhec VRRROOOOM, VROOOOM, VROOOOOOOOMMMM, glaug, glaug, glaug, glaug. O motor V8 dele decide voltar à vida e me presentar com o seu feliz e saudável ronco. Depois de esquentar um pouco, saio da oficina para a casa da Adriana e, enfim, mostrá-lo como era bacana um Dodge. Como ela não estava, lá fui eu sozinho levá-lo até a clínica lá em Rudge Ramos (lembra do primeiro post? Então, levou "apenas" seis meses para completar a missão! rs). Pego a via Anchieta, ainda apanhando para entender como engatar marchas no câmbio com alavanca na coluna (sim, já havia encavalado duas vezes até chegar lá. Farei um próximo post em breve, só sobre encavalamentos de câmbio), mas ele chega até o seu destino em plena saúde. Aliás, leia-se "plena saúde" como cheio de barulhos diversos de peças soltas, vento entrando pelas borrachas ressecadas, e escapamento meio-que-furado. Mas foi o máximo!!!
Parei o carro na melhor posição possível, e alguém (não me lembro quem foi, desculpem!) foi me buscar lá. Segue diálogo:
- Oi, tudo bem? Nossa, que cheiro!
- Oi. Do que? Não tô sentindo cheiro direito...
- Sei lá, parece gasolina.
- Deve ser das minhas mãos.
- Nossa, mas tá muito forte!
- Calma que ninguém vai pegar fogo.
Chego em casa, e todo o mundo fala a mesma coisa, então tomo um banho... e depois do banho constato que minha roupa fedia a gasolina queimada, como gases de escapamento de um motor com mistura rica. Eis que dava início a uma das sagas que findaram insolúveis com o Dodge - tentar tirar este cheiro que ele exalava.
Para vocês terem ideia, o cheiro era tão incômodo que a Adriana escolhia as roupas para sairmos baseada no carro que iríamos uilizar - se era com o Dodge, podia ser roupa meio surrada e só passar batom, e pronto. Eu chegava a lacrimejar depois de dirigí-lo por mais de uma hora (lágrimas não de emoção, mas dos olhos ardendo porcausa do cheiro). Para evitar isso, tentei de tudo. De trocar borrachas da parede de fogo (aquela chapa que separa o compartimento do motor do interior do carro) a todas as borrachas do carro, de passar espuma de poliuretano expansível (aquela da lata em spray) a fatiar três maçãs para absorver o cheiro, e trocar todo o estofamento do carro, tudo o que vocês possam imaginar foi feito. E esse cheiro era tão desagravável que quando eu ia trabalhar com ele, me sentia incomodado em participar de reuniões pois TODOS saberiam que fui ao serviço de Dodge PELO CHEIRO.
Houve uma vez que, após ter um carburador quadrijet e um câmbio de 4 marchas instalado nele, decidi ir até Mogi ds Cruzes e voltar, numa noite de sexta. Esta curta viagem, de aproximadamente 130 Km ida e volta, teve como resultados:
- ter consumido meio tanque de gasolina aditivada
- constatar que o cambio de 4 marchas não fez tanta diferença assim no comportamento do carro (logo, foi $$$$$$ gasto sem necessidade)
- ter ficado tão fedido de gasosa a ponto de ter tomado banho ao chegar em casa e ainda sentir o cheiro em mim no dia seguinte.
A esperança em torná-lo um veículo menos mal-cheiroso e tóxico chegou ao fim quando um ex-colega de faculdade ficou maravilhado com o Dodge e, na série de "putz, o do meu pai era igual, que legal, era assim e assado", ele entra no carro (num daqueles dias em que um hamster morreria asfixiado se ficasse mais de 10 minutos dentro do Dodge) e comenta, todo sorridente "Meu, ERA ESSE CHEIRINHO QUE O CARRO TINHA!!! QUE DA HORA!!!". Desmoronaram as esperanças e só me restava o consolo que, se queria comer alho, tinha que conviver com o bafo que ele deixava (é a melhor metáfora que consigo encontrar).
É, há lembranças que nos fazem sorrir, emocionar e às vezes chorar... seja qual for o sentimento, esta lembrança olfativa do Dodge branco 75 eu jamais esquecerei.